Caminhar pelo centro de uma cidade viva explica tudo. Cada vitrine acesa, cada térreo ocupado e cada janela com gente morando muda a sensação de segurança, gera empregos e devolve a cidade para as pessoas. É esse impacto urbano que guia a pergunta central deste texto: como empresas de tecnologia podem transformar cidades?
A resposta começa no palco do evento do SECOVI sobre a requalificação do centro de Sorocaba e passa pela minha história no setor público, pela origem do Vale do Silício, por princípios de comunidade empreendedora e por casos brasileiros que já criam valor em áreas centrais.
Contexto e posicionamento: onde a Morada.ai atua
A Morada.ai trabalha com incorporadoras e loteadoras. Esses agentes conseguem traduzir inovação em transformação concreta no território. Quando dados, produto digital e atendimento inteligente se encontram com quem constrói e comercializa, novas centralidades surgem, térreos ganham vida e imóveis vazios voltam a ser moradia. Acreditamos em produzir transformação no Brasil, acelerando a conexão entre oferta, demanda e cidade.
Minha trajetória e por que hoje empreendo com tecnologia
Minha história começou na Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação de Minas Gerais, ao lado do então subsecretário Leonardo Dias, que via inovação como política pública aplicada. Três experiências moldaram meu olhar e explicam por que hoje empreendo com tecnologia.
SEED MG
Programa de aceleração pública que atraiu startups, abriu mentorias e espalhou conhecimento pelo ecossistema.
FINIT
Uma feira de inovação com milhares de pessoas, comunidades e rodadas de negócio que ativou o estado inteiro.
Minas Digital
Formação de jovens, bolsas para criação de startups e mobilização de investimento privado em larga escala.
Aprendi que políticas funcionam quando empreendedores lideram. Essa base me traz até a Morada.ai, onde conecto dados, IA e canais digitais a quem quer morar e a quem desenvolve projetos urbanos.
Para entender cidades inovadoras, volte ao início: o transistor e a semente do Vale
Começa com um experimento numa bancada apertada. Em 1947, John Bardeen e Walter Brattain, nos Laboratórios Bell, mostraram que um pequeno sanduíche de materiais podia controlar a passagem da eletricidade com precisão. Esse “bloquinho” passou a se chamar transistor. Pense nele como uma torneira microscópica que abre e fecha o fluxo elétrico ou como um amplificador que dá voz a sinais fracos. Essa peça substituiu válvulas grandes e frágeis, encolheu máquinas inteiras e abriu caminho para rádios de bolso, computadores e, depois, tudo o que cabe hoje no seu telefone.
Poucos anos depois, William Shockley, do mesmo time que ganharia o Nobel, toma uma decisão improvável. Em vez de ir para Boston ou Nova Iorque, ele abre sua empresa em Mountain View, uma cidadezinha agrícola no sul da Baía. Naquele tempo, Mountain View era distante dos centros de pesquisa e de capital. Faltavam fundos de investimento, faltavam engenheiros experientes em semicondutores, Stanford ainda não tinha o peso que teria mais tarde e quase não existiam laboratórios especializados por perto.
Mesmo assim, o laboratório de Shockley puxou gente talentosa. Alguns desses jovens, inquietos com o rumo da empresa, saíram para fundar a Fairchild Semiconductor. Dali nasceu uma árvore genealógica de negócios que redesenhou a região. Mais do que um salto de hardware, foi um salto cultural. Pessoas que aprendiam e devolviam. Professores que indicavam alunos. Investidores que apresentavam fundadores. A regra não escrita era simples. Alguém me ajudou ontem, eu ajudo outra pessoa hoje. É assim que uma cidade comum começa a comportar algo extraordinário.

Laboratório da Bell Telephone em cena histórica que contextualiza a invenção do transistor em 1947 e sua demonstração em 1948. Base tecnológica que ajuda a entender como empresas de tecnologia podem transformar cidades
Give back, give first
Vimos como uma decisão improvável em Mountain View acendeu a faísca técnica do Vale. O que transformou a faísca em incêndio foi a cultura. O Vale cresceu porque instituiu hábitos simples que compõem um pacto social entre gerações de fundadores, investidores, professores e engenheiros.
Give back é retribuir o que a comunidade te deu. Tempo de mentoria. Introduções a pessoas certas. Escrever o que você aprendeu para quem vem atrás. A lógica é devolver para o ecossistema aquilo que te fez chegar até aqui.
Give first é ir além. Você ajuda antes de pedir. Abre portas sem calcular retorno imediato. Ensina o que sabe, compartilha contatos, testa ideias com quem está começando. A lógica é servir para que o próximo ciclo seja maior do que o seu.
No Vale isso virou norma cotidiana. Laboratórios, universidades, clubes de inventores e investidores cultivaram um jogo de soma positiva. Steve Jobs, ainda jovem, procurou Robert Noyce, cofundador da Intel, para ouvir e aprender. Noyce o recebeu, aconselhou, apresentou pessoas. Anos depois, Jobs replicou o gesto com outros fundadores. Esse fio entre gerações costura a região até hoje. Conhecimento circula, portas entreabertas viram encontros, encontros viram projetos, projetos viram empresas. É assim que um território com um punhado de laboratórios e poucas vias pavimentadas se torna uma máquina contínua de inovação.
Boulder Thesis e como empresas de tecnologia podem transformar cidades
Nesse ponto, chegamos a necessidade de atrair empresas de tecnologia e empreendedores, por isso, recorro a Brad Feld, que é investidor de risco, cofundador da Techstars e do fundo Foundry Group. Desde os anos 1990 ele investe, mentora e escreve sobre comunidades empreendedoras. Em Boulder, cidade de cerca de 100 mil habitantes no Colorado, onde convivem a University of Colorado, laboratórios federais de pesquisa e uma cena forte de startups, Feld observou durante décadas o que fazia o ecossistema crescer de forma consistente. Dessa prática nasceu a Boulder Thesis.
Empreendedores lideram
A agenda do ecossistema precisa ser puxada por fundadores em atividade. Governo, universidade e grandes empresas apoiam e habilitam.
Aplicação em Sorocaba: formar um círculo de founders que define três desafios do centro por trimestre e coordena os pilotos com poder público e parceiros.
Compromisso de longo prazo
Comunidades de startups amadurecem em ciclos de anos, não de editais. É um trabalho de compasso, não de foguete.
Aplicação: publicar e cumprir um calendário anual. Estabelecer mandatos de liderança com sucessão combinada para evitar hiatos.
Inclusão radical
Qualquer pessoa interessada deve encontrar porta de entrada clara. Sem clube fechado.
Aplicação: mentorias abertas mensais, formulário simples para quem está começando e office hours de fundadores e investidores acessíveis.
Cadência contínua
Atividades recorrentes criam confiança, laços e aprendizado composto. Quando uma termina, a próxima já está marcada.
Aplicação: três rituais fixos. Founders Meetup para pares aprenderem. Mentorias Abertas para portas de entrada. Showcase trimestral de pilotos no centro para dar visibilidade e atrair aliados.
Em resumo, a Boulder Thesis não é um evento, é um comportamento repetido. Quando fundadores lideram, quando há compromisso de longo prazo, quando a porta é aberta para todos e quando existe cadência, a cidade ganha densidade empreendedora. Sorocaba pode começar agora com pequenos compromissos que se repetem até virarem cultura.
Casos que conectam inovação e requalificação urbana
Porto Digital, Recife
Arranjo claro entre governo, universidades e empresas. Unidade gestora independente, incentivos previsíveis e foco territorial no bairro do Recife. Resultado visível em empresas, empregos e na volta da vida ao centro histórico, com economia criativa, TIC e serviços.
San Pedro Valley, Belo Horizonte
Movimento orgânico de fundadores. Encontros frequentes, give first como cultura, integração com universidades e desafios reais da cidade. A comunidade criou densidade de talento e capital e mostrou que cidades fora do eixo tradicional podem gerar tecnologia global.
Sorocaba na prática: como empresas de tecnologia podem transformar cidades?
Como empresas de tecnologia podem transformar o centro quando existe foco e coordenação.
- Desafios públicos de inovação
- Definir problemas claros do centro: iluminação inteligente, ocupação de térreos, rotas seguras de pedestres
- Selecionar startups locais para pilotos com metas simples e quebra de 90 dias, indicadores de uso e satisfação.
- Laboratório de dados do centro
- Abrir dados de vacância, fluxo, segurança e mobilidade.
- Publicar painéis simples que orientem comerciantes, incorporadoras e poder público.
- Calendário da comunidade empreendedora
- Encontros mensais no próprio centro com fundadores, universidades, investidores e gestão pública.
- Rituais que criam pertencimento e continuidade.
Onde a Morada.ai entra
Conectamos estoque disponível e interesse real por moradia. Dados e IA qualificada reduzem fricção entre quem busca e quem oferece. O resultado é mais gente morando, térreos ocupados, base de serviços crescendo e sensação de segurança melhorando.
Uma anedota que diz muito sobre reconhecimento

Em Berkeley, há vagas reservadas para laureados com Nobel. Um gesto que mostra como cidades que valorizam conhecimento atraem talento — e como empresas de tecnologia podem transformar cidades quando esse ambiente existe.
Créditos: foto disponível na internet
Em Berkeley, estacionar é difícil. A menos que você tenha um Nobel. Existem vagas reservadas a laureados no campus. É um gesto simbólico. Cidades que reconhecem quem cria mandam um recado. Aqui se valoriza quem empurra a fronteira do conhecimento. Esse reconhecimento atrai talento e cria círculos virtuosos.
Conclusão
Acredito em um Brasil que produz inovação, tecnologia e reocupa seus centros urbanos. Isso nasce quando empreendedores lideram, quando há continuidade e quando o centro vira palco de experimentação. A Morada.ai está nessa jornada com incorporadoras e loteadoras para transformar vacância em vida urbana.
Quer olhar dados do centro e testar pilotos com a gente? Vamos nos conhecer!
Autor:
